quarta-feira, 3 de setembro de 2014

A cor do poder: os negros e a política.

Antes, ao refletir sobre nossa sociedade, meus pensamentos estavam “contaminados” por uma série de construções normativas, ou seja, por ideias que fazem parte de uma arquitetura política que sempre ofereceu e continua querendo manter privilégios apenas para uma elite branca. Em consequência disso, eu não atentava para o quão significativos são os lastros instalados pelo preconceito. Não entendia porque após tantos anos da Abolição da Escravatura, impulsionada por lutas e por pressão comercial estrangeira; após tantos anos da proclamação de uma república plagiada pelo ideal francês de liberdade, igualdade e fraternidade, o negro ainda caminha como se fora um escravo emancipado, como peça de comando numa estrutura política baseada nos padrões eurocêntricos, que fazem com que mesmo aqui, na cidade do Salvador, retrate um absurdo: ser a cidade com maior população negra fora da África, mas que nunca elegeu um Negro como governante.
Após contato e experiências através de estudos e leituras sobre a formação das elites brasileira, retirei o véu da ignorância e pude ficar mais atento aos discursos paralelos oriundos das teorias racialistas de Nina Rodrigues, Silvio Romero dentre outros teóricos aristocratas. Hoje, apropriado de um maior senso crítico ouso falar com mais propriedade a respeito do que me toca.
A questão é que mesmo em maior número, os negros não foram inseridos nos ideais políticos da republica brasileira quando da sua construção, sendo entregues à própria sorte, espalhados pelos diversos cantos do país após o fim da escravidão, que não se deu por bondade; seguiram sobrevivendo de atividades quaisquer, pois estavam sendo substituídos, principalmente, por trabalhadores brancos, os imigrantes, oriundos de um projeto político de embraquecimento do povo brasileiro. Apesar disso, para justificar a falta de interesse em mudar a situação do Povo Negro muitos preferiram defender a ideia de que os mesmos se auto discriminam ou não se interessam em assumir uma posição de poder, e há até mesmo quem acredite que os negros não possuem qualificação para assumir posições de comando.
Ora, o Povo Negro teve dificuldades em se organizar politicamente, pois foram impedidos de participar da vida política deste país, tiveram sua cultura e suas crenças marginalizadas e em seguida apropriadas por um projeto de construção de uma identidade nacional de uma pseudo democracia racial. As identidades negras eram, então, pertencentes a uma nação aparentemente democrática, e não mais um meio de organização de um povo oprimido. Paralelo às apropriações, não se criou uma política de inclusão social do Povo Negro, foram criados marcadores que desqualificaram os negros enquanto cidadãos e nos fizeram parecer incapazes para exercer o comando na sociedade, até mesmo na sociedade da qual nós negros somos maioria.
Avanços vêm-se apresentando na situação socioeconômica do Povo Negro, porém muito aquém do que se espera de uma sociedade dita igualitária, e de forma contundente o negro ainda se mantém pouco representado no comando político da nação, nos estados ou nas capitais do país. Os negros ocupam os piores índices de condições sociais e se apresentam em menor número nas condições de privilégio.
Sabemos que a elite branco-heterossexual-cristã e detentora do poder, não quer e não pretende perder seus privilégios, o que inclui os melhores postos de trabalho e os melhores cargos políticos. Para tanto, sempre prepararam seus filhos e apadrinhados para exercerem esses cargos, seja indo à Europa estudar, como na época do Império, seja hoje, ocupando as vagas nos cursos de melhores estatus sociais nas universidades públicas do país, e discursando contra as cotas sociorraciais.

Assim, creio que está mais do que na hora de discutirmos a cor do poder, está na hora de falar da invisibilidade da branquitude, desses que sempre estiveram no poder, mas que se mantêm intocados como se sobre nada fossem responsáveis. Creio que devemos discutir com mais força sobre o poder que cria marcadores e define a posição dos corpos, enfim, sobre o poder da branquitude, porque se quisermos saber sobre os negros, basta olharmos as estatísticas.

Denílson Lima da Cruz[1]



[1] Estudantes da UFBA – Universidade Federal da Bahia, no Curso de Bacharelado Interdisciplinar e Humanidades, da Disciplina: Oficina de Textos em Humanidades, ministrada pelo Professor: Carlos Henrique Lucas Lima.